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Todas as religiões são caminhos de salvação?


A pergunta-título deste post é bastante pertinente. Vivemos numa sociedade em que a tolerância “politicamente correta” para com as diversas religiões não só está na moda como também constitui um verdadeiro compromisso para muita gente e para muitas organizações importantes.

Pluralismo e tolerância são palavras bastante populares na cultura atual. Todas as religiões teriam o mesmo valor, e a nenhuma delas é dado o crédito de ser a defensora da verdade. Quantas vezes ouvimos dizer que “o importante é crer em alguma coisa”, e quem afirma o contrário se arrisca a ser perseguido.

O mais grave é que mesmo dentro de ambientes religiosos, que teriam por obrigação defender a verdade perante o mundo, - sem a preocupação de atender os interesses de quem quer que seja, sem “ficar em cima do muro”, sem “fazer média” com ninguém, - os conceitos de tolerância e de pluralismo têm adquirido enorme espaço, a ponto de determinados ensinamentos catequéticos terem se tornado, de certo modo, assuntos "politicamente incorretos", que estão sendo evitados ou, pelo menos, suavizados. Já não se diz a verdade simplesmente, mas procura-se disfarçá-la ou “enfeitá-la”. É o caso, por exemplo, quando se trata da justiça de Deus. Muitos padres e catequistas já não querem mais falar em justiça divina: dizem apenas que Deus é Amor, é misericórdia infinita, como se de um dia para o outro a doutrina cristã tivesse mudado. Nesta época em que domina a pressão globalista a favor do relativismo religioso, "ter uma fé clara, segundo o Credo da Igreja, muitas vezes é classificado como fundamentalismo", assim como já esclarecia o Cardeal Joseph Ratzinger/ Papa Bento XVI (Missa Pro Eligendo Romano Pontifice, abril de 2005).

O que se busca é uma espécie de religião única, globalista, que unifique todos os credos numa superreligião. Assim, cria-se a equivocada sensação de que qualquer proposta religiosa é válida para a salvação, até as mais absurdas, as mais contrárias aos valores que construíram a nossa civilização, a nossa sociedade. A tática consiste na elaboração de um sistema neopagão para o qual não exista nenhuma autoridade planetária que não a política. - Obviamente, a doutrina católica, sobretudo o que afirma sobre o papado e o ensinamento sobre a necessidade da Igreja para a salvação, que são artigos irrenunciáveis da fé cristã, tornam-se pedras de tropeço para esse objetivo.

O Magistério da Igreja, preocupado com a onda relativista, procurou e vem procurando esclarecer esses assuntos em várias ocasiões. O Verbo de Deus encarnou-se uma única vez; somente Nele se encontra a plenitude da Revelação e os meios necessários para o autêntico encontro com Deus. É através de Jesus Cristo e de sua continuação histórica na terra, que é a Igreja Católica, que o homem pode ser salvo. Sabemos que não há outro Nome debaixo do céu pelo qual a humanidade possa alcançar a salvação (At 4,12), o que nos leva a lembrar a Declaração Dominus Iesus, que diz: "Assim como existe um só Cristo, também existe um só seu Corpo e uma só sua Esposa".

Portanto, nós, católicos, não podemos aceitar a proposta de globalização da religião. Cremos que já existe a religião global, universal. Esta religião é a católica, sendo que a palavra quer dizer exatamente isto, universal. A Igreja Católica é a Igreja para a qual todos os seres humanos foram criados, e Jesus veio a este mundo para que todos, aqui na Terra, ou derradeiramente lá no Céu, pertençam à sua Igreja. Se alguém tem alguma dúvida de que esta é a doutrina católica, basta consultar os documentos oficiais da Igreja, como a Declaração Dominus Iesus (2000) e/ou a notificação da Congregação para a Doutrina da Fé sobre o livro "Para uma teologia cristã do pluralismo religioso", do padre jesuíta Jacques Dupuis. Este documento (2001) elencou cinco pontos básicos e inegociáveis da doutrina católica, principalmente na temática da salvação. A Santa Sé visava corrigir certos equívocos do autor do livro, padre Dupuis, e, ao mesmo tempo, ajudar os católicos a praticarem uma reta reflexão acerca do pluralismo e da tolerância religiosa, dentro do que é aceitável e verdadeiramente católico.

O primeiro ponto Jesus Cristo é o único e universal mediador da salvação de toda a humanidade. A notificação rechaça a tese de "uma ação salvífica do Verbo" alheia à Pessoa de Cristo, ou seja, "independentemente da humanidade do Verbo encarnado". Com isso, a Congregação reafirma a supremacia do cristianismo sobre todas as outras religiões. Somente na fé cristã Deus se encarnou, sofreu e morreu na cruz pela humanidade. A ideia segundo a qual Deus teria, de algum modo, se encarnado em todas as religiões, e que Jesus seria portanto apenas mais uma dessas muitas encarnações ou avatares é para o cristianismo simplesmente absurda, sem qualquer respaldo teológico ou bíblico.

O segundo ponto destaca a unicidade e a plenitude da revelação em Jesus Cristo. É um dever de todo cristão crer firmemente na Mediação de Cristo, no cumprimento e na plenitude da Revelação nEle e através dEle, sendo "contrário à fé da Igreja" afirmá-la "limitada, incompleta e imperfeita". Não há uma única verdade de fé necessária à salvação que não esteja contida na doutrina cristã e, embora existam elementos de verdade nas outras religiões, todas elas, de uma maneira ou de outra, derivam "em última análise da mediação frontal de Jesus Cristo". Nenhuma outra doutrina ou religião “completa” o cristianismo.

O terceiro ponto recorda a capacidade do Espírito Santo de agir "de maneira salvífica tanto nos cristãos como nos não-cristãos". Todavia, a mesma notificação ensina ser "contrário à fé católica pensar que a ação salvífica do Espírito Santo possa estender-se para além da única e universal economia salvífica do Verbo encarnado". Isso quer dizer que toda ação do Espírito Santo tem por meio a Igreja - sacramento universal da salvação -, mesmo entre os não-cristãos. A ação do Espírito Santo fora da Igreja existe, mas tem a intenção de trazer todas as pessoas à Igreja de Cristo, que confere os Sacramentos para a santificação e salvação.

O quarto ponto recorda a vocação universal do homem. Toda a humanidade foi orientada para Jesus: existe uma vocação específica dos seres humanos de todos os tempos, de todos os lugares da história para a Igreja de Cristo. Com isso, a Congregação afirma que "também os seguidores das outras religiões estão orientados para a Igreja e todos são chamados a fazer parte dela", não sendo possível "considerar as várias religiões do mundo como vias complementares à Igreja em ordem à salvação".

O quinto e último ponto da Congregação para a Doutrina da Fé responde à pergunta central: "Nós podemos afirmar que todas as religiões são caminhos de salvação?" O esclarecimento é categórico ao definir que, se por um lado "é legítimo defender que o Espírito Santo realiza a salvação nos não-cristãos também mediante os elementos de verdade e de bondade presentes nas várias religiões", por outro "não tem qualquer fundamento na teologia católica considerar estas religiões, enquanto tais, caminhos de salvação, até porque nelas existem lacunas, insuficiências e erros que dizem respeito a verdades fundamentais sobre Deus, o homem e o mundo". As verdades contidas nestas religiões podem contribuir para a salvação dos seus membros enquanto verdades ligadas à Pessoa de Jesus Cristo.


Resumo

Finalmente, que dizer a respeito das muitas religiões? São elas caminhos de salvação? Por tudo o que vimos, a resposta é bastante clara: enquanto religiões, não; elas não são caminhos ou instrumentos de salvação. As verdades que estão contidas nelas, - e que se encontram também fora delas, pois o Espírito Santo age em diversos povos, culturas, religiões, orientando as pessoas para Cristo e para sua Igreja, - podem servir como instrumentos que acabarão, indiretamente, conduzindo à salvação.

Esta doutrina, que para o gosto dos homens modernos muitas vezes parece antiquada, ao contrário do que alguns podem imaginar, está em plena concordância com o que afirma o Concílio Vaticano II, citada na Constituição Lumem Gentium (nº16). Por isso, um pliralismo religioso é uma realidade incompatível com a doutrina católica.

Com estes ensinamentos a Igreja não quer dificultar o diálogo interreligioso, tampouco insuflar a intolerância. A Igreja quer, sim, conviver pacificamente com todas as culturas e religiões. Não raras vezes convidou para o diálogo humano fraterno e respeitoso. Mas não pode renunciar àquela missão  que lhe foi confiada por Nosso Senhor: "Ide pelo mundo e fazei discípulos entre todas as nações" (Mt 28, 19). Para que exista um diálogo saudável, porém, é necessário que ambas as partes sejam sinceras e conscientes de suas identidades. Caso contrário, corre-se o risco de edificar a casa sobre a areia da mentira e da falsidade, condenando-a, futuramente, ao desmoronamento. Foi o que explicou o próprio Cardeal Ratzinger a propósito das polêmicas relacionadas àDeclaração Dominus Iesus.

A missão da Igreja é universal, pois corresponde ao chamado do Salvador, que quer que todos as pessoas sejam salvas. Mas esta missão se dá através dEle, o Filho de Deus encarnado, Jesus Cristo; a salvação dos homens só acontece por meio de Jesus Cristo, na sua continuação histórica nesta Terra: a Igreja Católica.

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Fontes:
* DECLARAÇÃO "DOMINUS IESUS" SOBRE A UNICIDADE E A UNIVERSALIDADE SALVÍFICA DE JESUS CRISTO E DA IGREJA, Congregação para a Doutrina da Fé
NOTIFICAÇÃO
** NOTIFICAÇÃO A PROPÓSITO DO LIVRO DE JACQUES DUPUIS "PARA UMA TEOLOGIA CRISTÃ DO PLURALISMO RELIGIOSO" (ED. QUERINIANA, BRÉSCIA 1997), Congregação apra a Doutrina da Fé, disponível emhttp://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/documents/rc_con_cfaith_doc_20010124_dupuis_po.html
Acesso 7/10/013
*** Adaptado do episódio 191 da série de vídeos "A Resposta Católica", do Pe. Paulo de Azevedo Jr., disponível em http://padrepauloricardo.org/episodios/nos-podemos-afirmar-que-todas-as-religioes-sao-caminhos-de-salvacao

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