“A Colina das Cruzes é o testemunho vivo de que os poderes deste mundo passam, mas a Cruz de Cristo permanece”
Com frequência, os Papas do século XX alertavam o mundo para a incompatibilidade entre a doutrina católica e o socialismo. Em uma das afirmações mais categóricas sobre o tema, Pio XI escreveu: “Socialismo religioso, socialismo católico são termos contraditórios: ninguém pode ser ao mesmo tempo bom católico e verdadeiro socialista”01. O que para muitos parece, até hoje, uma lição difícil de aprender – não é raro ver muitos indivíduos ditos católicos prestando homenagem a figuras vermelhas como Karl Marx, Che Guevara ou Fidel Castro –, para quem viveu a opressão comunista nunca a verdade de um ensinamento eclesiástico brilhou com tanta evidência. As palavras da Igreja simplesmente confirmavam a realidade histórica de inúmeros cristãos perseguidos por um regime ateísta e sanguinolento, hostil a qualquer referência a Deus, mesmo que fosse mínima.
Exemplo desta oposição insuperável entre as duas realidades é a perseguição que o cristianismo enfrentou na Lituânia, em meados do último século. Como se sabe, o país do leste europeu foi um dos muitos anexados à União Soviética, permanecendo por 50 longos anos sob seu domínio. Durante este período, um local específico foi alvo da ira dos agentes soviéticos: a Colina das Cruzes, localizada no norte do país.
A Colina das Cruzes é um refúgio para os católicos lituânios em tempos de dificuldades. No século XIX, durante o domínio do Império Russo, estourou na região uma revolta contra o czar, por este não ter deixado as famílias honrarem seus mortos. Os lituanos acorreram à colina, hoje próxima à cidade industrial de Siauliai, e colocaram cruzes em memória dos fiéis defuntos, apesar da oposição das autoridades. Pouco a pouco o número de cruzes e o seu tamanho iam crescendo gradativamente.
Hoje, o lugar é um centro de peregrinação católica e já foi visitado inclusive pelo beato João Paulo II. Mas, na década de 1960, a Colina estava ameaçada pela KGB, que havia decretado a sua extinção. No dia 5 de abril de 1961, incomodados com o grande número de crucifixos que era instalado no local – um sinal de luto pela deportação dos lituânios à Sibéria, a mando de Stálin –, os soviéticos enviaram vários bulldozers ao local. As cruzes foram totalmente destruídas: as de madeira foram queimadas, as de metal, sucateadas, e as de pedra foram quebradas e enterradas.
Nem por isso o povo lituânio deixou de ir à colina. Para surpresa da inteligência comunista, na manhã seguinte o lugar amanheceu repleto de cruzes. Os cristãos entravam ali de noite e, com sigilo e cuidado, fincavam mais cruzes na colina. A URSS não se deu por vencida: voltou a arrasar várias vezes o lugar. Mas, novamente, os fiéis católicos testemunhavam vivamente a sua fé. Mesmo com o lugar protegido pelo Exército e pelos agentes da KGB, a colina continuava se enchendo de símbolos cristãos.
Em vão as autoridades soviéticas tentavam afastar os católicos do local. Depois de alegarem que às cruzes e imagens sacras faltava “valor artístico”, por inúmeras vezes as estradas de acesso à colina foram bloqueadas e eram emitidos falsos alertas de “epidemias” na região. Nada adiantou: cada vez que as cruzes eram destruídas, apareciam outras tantas. Mesmo quando o Exército bloqueava as estradas, os vizinhos arrumavam um jeito e introduziam cruzes enormes no lugar.
Por fim, em 1979, um corajoso sacerdote atreveu-se a desafiar o regime vermelho e convocou uma procissão até ali, junto com toda a sua paróquia. A KGB finalmente deu o braço a torcer, pois percebeu que seu ódio à fé só aumentava ainda mais o amor do povo lituânio a Cristo. Com o fim da tirania e a queda da União Soviética, a Colina das Cruzes – com mais de 100 mil crucifixos e ícones sacros – acolheu um santuário ao qual peregrinam fiéis de todo o mundo.
Sem dúvida, o visitante mais ilustre que a colina já recebeu foi o bem-aventurado João Paulo II. Em visita ao país, há exatos 20 anos, o Papa Wojtyla recordou a passagem dacarta de São Paulo aos colossenses, na qual ele diz completar em sua carne “o que falta às tribulações de Cristo” (Col 1, 24). Ele também classificou a peregrinação como “uma experiência comovedora”. “Depois dessa visita, a todos nós parecia mais clara a verdade que expressou o Concílio Vaticano II, a saber, que o homem não pode compreender-se profundamente a si mesmo sem Cristo e sem sua cruz. A este respeito, a Colina das Cruzes é um testemunho eloquente e uma advertência. A eloquência desse santuário é universal: é uma palavra escrita na história da Europa do século XX”02.
A Colina das Cruzes é o testemunho vivo de que os poderes deste mundo passam, mas a Cruz de Cristo permanece.
Por Equipe Christo Nihil Praeponere