Por
que será que grifes como a cobiçada Abercrombie usam imagens de modelos
sarados e seminus para vender jeans e roupa de baixo para um
público-alvo predominantemente formado por homens heterossexuais? Quem
lançou o estilo foi a Calvin Klein, no início dos anos 90. Vinte anos
depois, a fórmula está consagrada, mas a maioria dos homens jamais
admitiu que essas imagens de teor sexual evidente têm influência em suas
decisões de compra. Uma recente pesquisa de neuromarketing lançou mão
de exames de ressonância magnética para descobrir como o cérebro
masculino é afetado por essa visão.
Dezesseis
voluntários, oito héteros e oito gays, assistiram à apresentação de
cinco imagens de bonitões fotografados de sunga ou samba-canção. Todos
eles tiveram duas áreas relevantes do cérebro afetadas: uma relacionada à
excitação provocada visualmente e outra relacionada ao esforço para
dissimular ou mentir. A diferença é que esta segunda área foi mais
estimulada no caso dos heterossexuais.
A
propósito de revelações que as empresas preferem guardar para elas, o
metrossexualismo já avançou mais do que se imagina. Segundo um insider
da indústria de produtos de consumo, 15% de todos os homens nos Estados
Unidos depilam suas “partes privadas” – e a tendência é de crescimento.
Não é à toa que já há redes de supermercado criando “áreas masculinas”,
onde homens em busca de produtos de beleza podem circular à vontade. “De
modo similar, a Procter & Gamble hoje procura garantir que os
cosméticos para homens e para mulheres sejam expostos em corredores
diferentes, de modo que o comprador masculino independente não se sinta
desconfortável ou emasculado ao apanhar um creme facial ou um suavizador
de olheiras enquanto a mulher a seu lado escolhe um batom”, escreve
Martin Lindstrom, um consultor dinamarquês especializado em gestão de
marcas, em seu novo livro, Brandwashed (“Truques que as companhias usam
para manipular nossas mentes e nos persuadir a comprar”).
US$
100 bilhões é o tamanho do mercado de data mining, um negócio global
devotado a rastrear e analisar o comportamento do consumidor, de modo a
criar possibilidades de persuasão e manipulação
Tops infantis com enchimento-
Depois
de explicar o uso da neurociência no mundo da publicidade em Buyology
(“A lógica do consumo”, em português sem graça), e entrar na lista da
revista Time das 100 pessoas mais influentes do mundo, Lindstrom
ressurge com uma nova persona literária. Sai de cena o guru do branding.
Entra o marqueteiro arrependido, disposto a apontar um dedo, por
exemplo, para fabricantes de produtos que, literalmente, viciam. Doritos
e Red Bull, claro. Mas até protetores labiais. “Quantas vezes por dia
você aplica essa coisa grudenta? Cinco? Dez? Vinte e cinco?” pergunta
Lindstrom. “A menos que viva no Ártico, não é possível que seus lábios
estejam tão rachados que você precise reaplicar de hora em hora.” Há
pelo menos dois culpados pelo vício. O mentol, “um ingrediente não
essencial adicionado a muitas marcas de gloss, [que] embora não seja
perigoso por si só, pode ser um formador de hábito”, e o fenol, “um
ácido carbólico que pode na verdade ressecar nossos lábios ao interferir
na habilidade natural das células da pele de produzir sua própria
umidade”. Em outras palavras, “quanto mais protetor labial você usa,
mais precisa usar”.
Até
chegar à idade de se preocupar com lábios ressecados, o consumidor já
foi alvo de muitas outras artimanhas. Possivelmente desde a infância – a
palavra reconhecida por mais bebês no mundo todo hoje é McDonald’s.
Certamente na pré-adolescência. Meninos e meninas estão alcançando a
puberdade, em média, um ano mais cedo que nas décadas passadas. E daí?
“Bom, puberdade significa produtos – lâminas e espuma de barbear, gel
para acne, desodorante”, afirma Lindstrom. De 2007 para 2009, a
porcentagem de garotas de 8 a 12 anos que usavam maquiagem no rosto e
nos olhos quase dobrou. A Abercrombie – de novo ela – não resistiu à
tentação e andou vendendo tops com enchimento para meninas de 8 anos.
Pouco sutil? Não, se comparada a uma rede varejista britânica que criou
um kit com uma “dançarina do poste” para mocinhas de 10 anos e ainda
escreveu no rótulo: “liberte a gatinha sexy que há dentro de você”.
Quando
se preparava para lançar a marca Axe, a Unilever mobilizou seus
marqueteiros em diversos países para rastrear homens em modo de sedução.
Descobriu, por exemplo, que homens pensam em sexo, em média, 32 vezes
por dia. Pesquisadores da companhia acompanharam centenas de marmanjos
em noitadas de pegação e, com base na observação, definiram seis perfis
masculinos: o predador, o talento natural, o homem para casar, o amigão,
o novato inseguro e o novato entusiasmado. Com os dois últimos na mira,
os publicitários criaram uma campanha nada sutil, mas bastante precisa.
Comerciais de TV em que nerds irrecuperáveis eram literalmente atacados
pelas garotas mais quentes da balada transformaram Axe na marca
masculina de desodorante número 1 dos Estados Unidos em 2006.
“Entretanto, o tiro certeiro inicial logo começou a sair pela culatra”,
lembra Lindstrom. Axe passou a ser vista como uma marca para moleques
cheios de espinhas desesperados para se dar bem com as meninas.
Pastas de dente com atum-
Em
Brandwashed, Lindstrom mergulha no “mundo de US$ 100 bilhões do data
mining (…), um enorme e rapidamente crescente negócio global devotado a
rastrear e analisar o comportamento do consumidor e então categorizar,
resumir e amaciar esses dados, de modo que possam ser usados para nos
persuadir e, em algumas ocasiões, nos manipular para que compremos
produtos”. Para ter uma ideia da relevância dessa atividade, saiba que o
Walmart opera hoje um banco de dados muitas vezes maior que o do
governo americano. É graças a ele que a cadeia supermercadista sabe que
quem compra uma boneca Barbie tem 60% mais chances de comprar um em três
tipos de barra de chocolate. Ou que pastas de dente e latas de atum são
frequentemente compradas juntas.
É
com esse tipo de dados que se projetam as lojas de maneira a estimular o
consumo. Minerando dados de cartões de fidelidade, descobriu-se que
consumidores que se movem em sentido anti-horário gastam, em média, dois
dólares a mais a cada compra (porque a maioria de nós é destra e tem
mais facilidade para apanhar os produtos se a mão direita é que está
mais perto das gôndolas enquanto caminhamos). Por isso, a entrada das
lojas mais espertas está sempre à direita de quem olha o supermercado de
frente.
38% é o quanto crescem as vendas em lojas de
departamento que tocam música romântica
departamento que tocam música romântica
Você
talvez já tenha ouvido falar de Muzak, o nome que se dá à popular
música de elevador. Pois ela se transformou numa empresa que oferece a
varejistas do mundo todo 74 programas musicais renováveis, divididos em
dez categorias – o suficiente para criar trilhas sonoras para cerca de
100 milhões de pessoas por dia. Já reparou na preferência dos
supermercados por baladas românticas de andamento arrastado? É que
consumidores embalados por música lenta compram 17% mais em
supermercados e 38% mais em lojas de departamento. Em praças de
alimentação, ao contrário, o ritmo é animado. Mais batidas por minuto
nos fazem mastigar mais depressa.
Compras
virtuais são ainda mais coreografadas. “No ano passado, pesquisadores
da Universidade da Califórnia, em San Diego, descobriram que uma
proporção significativa dos 50 mil sites mais visitados na web estavam
engajados de alguma maneira em rastreamento comportamental – com alguns
empregando até mesmo uma análise conhecida como ‘farejamento da
história’, que remexe nossa navegação passada para descobrir que sites
visitamos nos últimos meses ou mesmo anos”, escreve Lindstrom. Não só a
nossa. “Não deveria ser surpresa, dado o tempo que a molecada de hoje
gasta online, que os mineradores de dados estejam coletando informações
sobre crianças a partir de 4 ou 5 anos de idade.” E eles estão dormindo
no ponto. De acordo com a AVG, uma empresa de segurança na internet, 92%
das crianças americanas já têm uma “pegada digital” antes de completar 2
anos. “É verdade”, afirma Lindstrom. “Vivemos em uma sociedade
pós-privacidade.”