“Pois certos homens ímpios se introduziram furtivamente entre nós, os quais desde muito tempo estão destinados para este julgamento; eles transformam em dissolução a graça de nosso Deus e negam Jesus Cristo, nosso único Mestre e Senhor” (Jd 1,4).
Ao estipularmos uma linha de tempo imaginária sobre os períodos do pensamento humano, veremos que a partir da Reforma e do advento dos filósofos iluministas acentuou-se um declarado e acirrado combate dialético contra o Cristo.
Obviamente, isso teve início de forma dissimulada, ainda um pouco antes. A princípio, questionando-se o absolutismo monárquico e, de tabela, o papel da Igreja Católica.
Voltaire, ícone do Iluminismo, por exemplo, com o propósito de questionar a Igreja, na verdade, apontava sua carga para a doutrina cristã, por ela preservada. Fica claro quando afirma“(…) ela (a Igreja) é a origem de todas as tolices e de todas as perturbações imagináveis. Tem sido a mãe do fanatismo e da discórdia civil. Se há uma inimiga declarada do gênero humano é ela. Atentai para isso”.
Mas a quais tolices, fanatismo ou perturbações inimagináveis Voltaire se refere? A preservação da integridade do Evangelho de Cristo?
Uma história que não é contada: após a queda do império romano e em meio às sucessivas invasões bárbaras, a Igreja Católica construiu o ocidente
Na verdade, conforme reflete o professor Felipe Aquino em seu livro Uma História que não é contada, (1) os mil anos de Idade Média (476-1453) foram uma fase valiosa e rica da história da humanidade, onde a nossa civilização ocidental, hoje preponderante, foi “preparada e moldada pela luz de Cristo”.
Em meio a um tempo caótico, os cristãos medievais salvaram o que havia de bom na cultura greco-romana, após a invasão dos bárbaros, e a desenvolveram de modo cristão, lançando as bases da nossa civilização moderna.
A cultura predominantes em nossos dias é a ocidental, e esta tem sua origem na Europa medieval moldada pela Igreja. A época moderna não surgiu a partir do nada; seus valores foram cultivados na Idade Média; como, então, esta poderia ser negativa? A Idade Média é a raiz boa da nossa Civilização Ocidental; e não, como querem alguns, a decadência do mundo romano antigo. A Idade Média berçou o mundo moderno.
Foi durante toda a Idade Média que se estendeu o trabalho paciente e árduo da Igreja na construção do Ocidente. Hoje, historiadores sérios admitem que é anti-histórico afirmar que a Idade Média foi um período de trevas, em função do Cristianismo.
Todo o centro do conhecimento e das artes do Ocidente floresceu a partir do advento do Cristianismo, uma vez que as primeiras universidades foram fundadas pela Igreja
Historicamente falando, como negar a contribuição da Igreja na arquitetura, na literatura, na pintura, na música, na educação, no ensino e, sobretudo, na cristianização do rude homem mediaval, persuadindo-o a olhar em direção a Cristo?
Como negar a ação evangélica da Igreja? A importância do monaquismo na preservação da cultura greco-romana e da própria tradição cristã? Quantas aldeias tornaram-se metrópoles ao se formarem sob os muros acolhedores dos mosteiros, onde os sinos proclamavam que almas consagradas estavam reunidas diariamente em torno do ideal do Cristo?
Como negar os grandes santos, filósofos e cientistas que vicejaram do seio da Igreja numa época tão desfavorável? Por que não se fala, hoje em dia, que todo o centro do conhecimento e das artes floresceu a partir do advento do Cristianismo e, por isso mesmo, as primeiras universidades foram fundadas pela Igreja?
A Igreja Católica construiu a cultura ocidental
E por falar em universidades, a primeira delas foi a de Bolonha, em 1158, na Itália, que teve a sua origem na fusão da escola episcopal com a escola monacal camalduense de São Félix.
A segunda universidade que teve maior fama foi a Sorbone de Paris, que surgiu da escola episcopal de Notre-Dame. Foi fundada pelo confessor de S. Luiz IX, rei de França, Sorbon. Ali estudaram grandes santos como Santo Inácio de Loyola, São Francisco Xavier e São Tomás de Aquino.
O documento mais antigo que contém a palavra “Universitas” utilizada para um centro de estudo é uma carta do papa Inocêncio III ao “Estúdio Geral de Paris”. A universidade de Oxford, na Inglaterra surgiu de uma escola monacal organizada como universidade por estudantes da Sorbone de Paris. Foi apoiada pelo papa Inocêncio IV (1243-1254) em 1254.
Até 1440 foram erigidas na Europa 55 Universidades e 12 Institutos de ensino superior, onde se ministravam cursos de Direito, Medicina, Línguas, Artes, Ciências, Filosofia e Teologia. Todos fundados pela Igreja. Das 75 Universidades criadas de 1100 a 1500, 47 receberam a Bula papal de fundação, enquanto muitas outras, seculares, receberam a mesma bula posteriormente.
Talvez seja interessante aqui refrescarmos a memória, uma vez que o ensino contemporâneo não dá o foco que estamos avaliando no presente estudo. Só na França havia uma dezena de universidades: Montepellier (1125), Orleans (1200), Anger (1220), Bolonha (1111), Pádua, Nápoles e Palerno. Na Inglaterra: Oxford (1214), nascida das Abadias de Santa Frideswide e de Oxevey, Cambridge. Além de Praga na Boêmia, Cracóvia (1362), Viena (1366), Heidelberg (1386). Na Espanha: Salamanca e Portugal, Coimbra. Todas fundadas pela Igreja Católica —a mesma erigida pelo próprio Cristo.
Afinal, que “luz” espiritual trouxeram os iluministas que tenha sido superior a do Cristo e Seu Evangelho?
Por que, então, engolimos o engodo Iluminista (Illuminati) regido pelogoverno oculto que astutamente incutiu nas mentes a idéia de que a Idade Média cristã foi uma longa “noite escura” no tempo?
E afinal, que “luz” espiritual trouxeram os iluministas que tenha sido superior a do Cristo e Seu Evangelho?
Certamente é muito oportuno avaliarmos aqui o tipo de claridade dessa “luz”. Que começa, aliás, nas artes e literatura, quando passou-se a desenvolver todo tipo de agressão à dogmática religiosa.
Essa verdade pode ser constatada nas obras literárias de Sheakespeare (1564-1616), Camões (1524-1580), Maquiavel (1469-1527), Lope de Vega (1562-1635), Jerônimo Bosch (1450-1516).
Nas artes, a tendência espiritual começou a sofrer golpes de Giotto (1266-1337), Botticelli (1455-1510), Leonardo da Vinci (1452-1519), Masaccio (1401-1428), Hans Holbein (1497-1543) e Albert Dürer (1471-1528).
A liberdade de pensamento e de expressão proposta pelo Iluminismo significa liberdade de pensamento e de expressão desvinculada da doutrina cristã
Como sempre, todos esses artistas, de uma maneira ou de outra, financiados pela elite do mecenato, instituição de vários burgueses mecenas que financiavam a literatura, as artes e as esculturas segundo interesses próprios e de mercado.
Em seguida, com o desenvolvimento do Iluminismo, a partir dos séculos XVII e XVIII, começou a declarada destruição da análise teocentrista da humanidade.
O ponto de partida, como sempre, foi a exarcebada apologia ao humanismo dissimulado em questionamentos ao “absolutismo” e em pról dos “direitos do cidadão”, filosoficamente orquestrado e patrocinado pelos dissimulados adeptos das sociedades secretas, já como medidas do grande plano do governo oculto do mundo, para destronar o Cristo, conforme alerta francamente Maria Santíssima em Suas inúmeras mensagens.
Na França, Voltaire (1694-1770) foi o maior dos filósofos iluministas e um dos maiores críticos do Antigo Regime e da Igreja. Defendeu a liberdade de pensamento e de expressão. Mas a liberdade de pensamento e de expressão, no caso, significa liberdade de pensamento e de expressão desvinculada da doutrina cristã. Ao combater a Igreja de Cristo enreda-se também Sua doutrina, preservada por essa instituição por Ele mesmo edificada. E, por isso mesmo afirmava em suas cartas: Ecrasez l´infâme, esmague a infame, isto é, a Igreja de Cristo.
A idéia de uma fraternidade em bases puramente humanas, sem a necessidade de Deus
O triunfo da apostasia e do ateísmo preconizados em La Salette se evidenciaria de forma brutal com a revolução russa de 1917, que implantou o comunismo, ou seja, o ateísmo militante e despótico.
Era o desfecho de parte de um longo trabalho ideológico, iniciado em fins do século XVII, no mundo religioso e cultural da cristandade e que recebeu o nome de “ilustração racionalista”.
Esse vasto movimento proclamava a soberania da razão sobre a fé e acalentava a certeza de que a humanidade seria capaz de um progresso indefinido, no qual encontraria a felicidade e criaria uma fraternidade em bases puramente humanas, sem necessidade de recorrer a Deus.
“A natureza — escrevia Emanuel Kant (1724-1804) — quer que o homem tire tudo de si… e que não participe de outra felicidade e perfeição além daquela que é capaz de proporcionar a si próprio mediante a razão”.
E Carlis Lamont: “Os seres humanos possuem poder para resolver seus próprios problemas, através de uma confiança aplicada primariamente à razão e a métodos científicos, levados avante com coragem e visão”. (2)
O pensamento filosófico dos últimos séculos mostra claramente que o furor anticlerical rapidamente enviesou-se contra a figura do próprio Cristo e de toda a teologia cristã
E desses ideais doutrinários humanistas em que Deus é posto de lado nasceriam estados totalitários e absurdamente despóticos como jamais vistos.
Um breve olhar sobre o pensamento filosófico dos últimos séculos mostra claramente que o furor anticlerical rapidamente enviesou-se contra a figura do próprio Cristo e de toda a teologia cristã. E, pateticamente, passa a tecer a mentalidade filosófica contemporânea.
Nietzche (1844-1900), por exemplo, despertou para a filosofia através de Schopenhauer (1788-1860), fascinado pelo seu ateísmo. Tanto que assim se exprimiu sobre este pensador: “Schopenhauer foi, como filósofo, o primeiro ateísta confesso e inflexível que nós alemães tivemos”. (3)
Luciferiano, Nietzche dispara: “… o declínio da crença no Deus cristão, a vitória do ateísmo científico, é um acontecimento da Europa inteira, em que todas as raças deve ter sua parte de mérito e honra”. (4) E isto “como uma vitória final, e duramente conquistada, da consciência européia, como o ato mais rico de conseqüências de uma disciplina de dois milênios para a verdade, que por fim se proíbe a mentira de acreditar em Deus.” (5)
Ainda em “A Gaia Ciência”, Nietzche faz a célebre declaração de que “Deus está morto”. Ou seja, a crença de que o Deus cristão caiu em descrédito já começa a lançar suas primeiras sombras sobre a Europa…
“De fato, nós filósofos e “espíritos livres” sentimo-nos, à notícia de que “o velho Deus está morto”, como que iluminados pelos raios de uma nova aurora…” (6)
E pelos lábios de Zaratustra proclama o seu deicídio nesta frase:
“O vosso Deus jorrou sangue sob o meu punhal… Deus está morto, agora nós queremos que o super-homem viva”. (7)
Escrevia ainda Ludwig Feuerbach: “A virada na história se dará no momento em que o homem tomar consciência de que o único deus do homem é o próprio homem”. Para ele a religião não passa de um caso de alteração da personalidade humana. E foi no Cristianismo que este processo de aviltamento atingiu o grau máximo. (8)
Lenin: “O marxismo é o materialismo”
Posteriormente, o antiteísmo de Karl Marx (Hegel, Strauss, Bauer e, sobretudo, de Feuerbach) que fez e continua a fazer sucumbir milhões de almas, postula um materialismo prático e direto:
“Eu tenho ódio a todos os deuses!” (9)
Lênin posteriormente decretaria:
“O marxismo é o materialismo. Por este título ele é tão implacavelmente hostil à religião, quanto o materialismo dos enciclopedistas do século XVIII ou o materialismo de Feuerbach”.(10)
Portanto, foi mesmo o materialismo a cartilha do marxismo e, seguramente, também uma das razões das grandes últimas intervensões de Maria Santíssima.
“Devemos combater a religião. Isto é o a-b-c de todo o materialismo e, portanto, do marxismo”. (11) “Nossa propaganda compreende necessariamente a do ateísmo”, (12)alardearia Lenin demolindo igrejas e assassinando religiosos.
Sartre: “Ainda que Deus existisse, em nada se alteraria a questão; esse é o nosso ponto de vista”
Pouco depois, o endeusado e muitíssimo influente pensador francês Jean Paul Sartre, que se tornou uma celebridade moralmente decadente com habilidades intelectuais afiadas para decorar as idéias antiteístas marxistas, definiria seu existencialismo ateu nos seguintes termos:
“O existencialismo não é de modo algum um ateísmo no sentido de que se esforça por demonstrar que Deus não existe. Ele declara antes: ainda que Deus existisse, em nada se alteraria a questão; esse é o nosso ponto de vista”. (13)
Mas permaneçamos por aqui. Uma vez que todos esses conceitos estão profundamente incutidos na intelectualidade da civilização globalizada, transmutando-a numa aberração humanóide, despojada de sua própria identidade, de seus reais valores e razão de ser.
Acirrada militância antiteísta
Com relação à ciência, especificamente, há uma tendência ateísta dominante em refutar qualquer coisa que possa sugerir Deus, alma/espírito, ou qualquer outro conceito que não possa ser efetivamente mensurável.
Ateus de carteirinha como Charles Darwin, Thomas Edison, Mikhail Bakunin, Isaac Asimovi, Carl Sagan, Michel Onfray, Michel Foucault, Mark Twain, Bertrand Russell, H. G. Wells, Bill Gates, José Saramago, James Randi, (14) Richard Dawkins, ganham cada vez mais adeptos da nova geração, já desencantada com a conduta de alguns representantes das grandes religiões e, sobretudo, por se oporem às falácias das pseudo-ciências da “nova era”.
Para segmentos científicos “afastar-se da religião é avanço civilizatório”
O cientista britânico Richard Dawkins, por exemplo, vendeu mais de 1 milhão de exemplares de seu best-seller Deus – Um Delírio. (15) Ele agora aponta sua artilharia contra o que considera superstições e pseudo-ciência: de astrologia a mediunidade, de homeopatia a cartas tarot.
Segundo a BBC Brasil, o novo ataque do conceituado biólogo da Universidade de Oxford foi veiculado em agosto (2007), na televisão britânica, com o seriado The Enemies of Reason (Os Inimigos da Razão), que Dawkins apresentou durante várias semanas no Canal 4. Seu esforço é desmontar as crenças e superstições que ele considera totalmente desprovidas de fundamento e provas, mas que convencem o público em vários países. (16)
Ultimamente esse tipo de publicação suscita incentivos que ganham rapidamente cada vez mais notoriedade. O Jornal da Ciência, edição 13/8/2007, sob o título “Afastar-se da religião é avanço civilizatório”, inicia o artigo com a seguinte chamada:
“Richard Dawkins, cientista britânico autor de “Deus, um Delírio”, defende a ciência e incita os ateus a ‘saírem do armário’, como fizeram os gays nas últimas décadas”. Ao final do artigo, o articulista questiona: “— A ciência tem resposta para tudo?” E ele mesmo conclui: “Ainda não, e talvez nunca tenha. Mas, se há algo que a ciência não pode responder, não há nenhuma razão para supor que a religião possa”. (17)
Assuntos como Deus, espiritualidade ou religião em certos círculos, principalmente acadêmicos, não são de bom tom.
É cada vez mais comum ouvirmos jovens definindo-se como ateus, céticos, racionalistas, niilistas…
Se, por um lado, há o fator positivo nessas organizações em investigar e denunciar falsos mitos e enganações, por outro, há o fator negativo devido a generalizada propagação quase absoluta de um total ceticismo espiritual. Aliás, ceticismo que tem sido assimilado passivamente pelas novas gerações.
É cada vez mais comum ouvirmos jovens definindo-se como ateus, céticos, racionalistas, niilistas… (18)
Lamentável constatar que as grandes verdades de Deus são tropeço para os homens que nutrem sua fé sobre suas débeis deduções
O ateísmo moderno tornou-se um universo ideológico muito diferenciado: ateísmo marxista, ateísmo racionalista, ateísmo existencialista, ateísmo axiológico, ateísmo científico, invertendo assim os papéis Criador / criatura. Conforme profetizou Lichtengerg: “Nós seremos como Deus”. (19) Concretizando-se, assim, a antiga sedução serpentina.
É lamentável constatar que as grandes verdades de Deus são tropeço para os homens que nutrem sua fé em suas próprias débeis deduções. Desgraçadamente, assim como os doutores da lei de outrora, movidos unicamente pelas tortuosas vias da racionalidade humana, também os doutos de nossos tempos ainda bradam desafiadoramente:
“Salvou os outros, e a si mesmo não pode salvar-se. Se é o Rei de Israel, desça agora da cruz, e crê-lo-emos.” (Mt 27:42)
A suprema negação de Deus…
Retomemos, nesse momento, a citação do comandante da Maçonaria americana, quando definiu esotericamente o espírito do anticristo, o eterno inimigo de Deus, o “portador da falsa luz”:
“… Satanás não é um deus negro, mas a negação de Deus… ele não é uma pessoa, mas uma Força, criada para o bem, mas que pode representar o mal. É o instrumento da Liberdade ou do Livre Arbítrio. Eles representam essa Força… sob a forma mitológica e cornífera do deus Pã; daí veio o bode do Sabá, irmão da Antiga Serpente e o portador da Luz…” (20)