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A vida do santo casal Martin


O Bom Deus me deu um pai e uma mãe mais dignos do Céu do que da Terra.”
(Santa Teresa de Lisieux)

Por Igor Andrade – Assoc. São Próspero

DESDE SEU SURGIMENTO (a partir do encontro do Direito romano, da Filosofia grega e da Religião judaico-cristã) a civilização Ocidental passa por diversos problemas, por vezes simples, por vezes terríveis. A partir da modernidade, porém, passamos por uma terrível crise com respeito à família. Luis e Zélia Martin vêm, por assim dizer (peço licença ao caro leitor), como um tapa na cara daqueles que se dedicam a destruir o coração de toda e qualquer sociedade.

"Batendo de frente" com os atuais romances cor-de-rosa (vide 'Crepúsculo' e 'A Culpa é das Estrelas', que são absurdamente irracionais), e “romances dark” (como o recente 'Cinquenta Tons de Cinza', que são loucos), a vida do santo casal Martin traz ao mundo moderno um genuíno exemplo de manifestação do amor. Não qualquer paixonite ou mero desejo carnal, mas um amor de verdade, que toca o coração do mais bruto troglodita.

Luis e Zélia se sentem chamados a servir ao Bom Deus na vida religiosa. Zélia tenta entrar no convento das Filhas da Caridade, mas não é aceita. Com um pouco de tristeza ela se conforma com a Divina Vontade, torna-se rendeira, decide abraçar o matrimônio e pede a Deus muitos filhos para Lhe serem consagrados.

Luis também deseja a vida religiosa e tenta entrar no convento de São Bernardo, mas, provavelmente porque não sabia latim, também não é aceito, então compra uma casa e faz dela um lugar de silêncio e oração. Torna-se relojoeiro e abre um negócio próprio. É interessante ressaltar que, na época, era comum os comerciantes abrirem os comércios aos domingos, Luis, porém, traz consigo um lema: “Deus o primeiro a ser servido”. “Sim”, dizia ele, “eu tenho um objetivo, e é amar a Deus de todo o meu coração”.

Por se tratar de um casal de santos, sua vida é repleta de sinais de amor do Bom Deus. Com efeito, não é de se estranhar que a cena mais hollywoodiana possível tenha acontecido em sua vida. Um dia (no mês de abril de 1858, segundo o padre Piat, confessor de Zélia), ao atravessar a ponte de São Leonardo, em Alençon, Luis e Zélia cruzam os olhares. “Este é o marido que preparei para ti”, sentiu Zélia no coração, como vindo do próprio Deus. Dito e feito.

A mãe de Luis (preocupada com o futuro de seu filho, que tem então 36 anos) se matricula num curso de rendeira, onde conhece Zélia. Ambas se aproximam e a jovem deseja conhecer o “homem de nobre fisionomia” que avistara na ponte. Conhecem-se e, no dia 13 de julho de 1858, se casam à meia-noite.

Luis propôs que vivessem como irmãos(!), e, durante os dez primeiros meses do casamento, viveram uma perfeita continência (ou seja, não tiveram relações sexuais). Zélia aceitou, embora tenha ficado triste em renunciar os possíveis filhos. Porém, o diretor espiritual do casal os orientou a terem filhos, essa era a vontade do Bom Deus.

Ressalto aqui, que eles não tiveram filhos no começo do casamento, não pelos motivos mesquinhos de hoje em dia, mas porque, naquela época, era comum achar que a santidade só era possível na vida celibatária. De qualquer forma, após a orientação do sacerdote, o matrimônio foi consumado.

Contudo, o tempo que passaram juntos antes do ato conjugal foi frutuoso para a vida do casal. “Ele me compreendia”, disse Zélia numa carta a sua filha Paulina, “e me consolava da melhor maneira possível, pois tinha os gostos parecidos com os meus; nossa afeição aumentou ainda mais, ele sempre foi para mim um consolador e um apoio”. Sobre os filhos, ela diz: “Quando os tivemos nossa visão mudou um pouco, vivíamos inteiramente para eles. O mundo não nos era mais pesado. Gostaria de ter muitos filhos para elevá-los ao Céu”.

Quando nasce a primeira filha, Luis diz ao sacerdote: “Essa é a primeira vez que venho aqui para um batismo, mas não será a última”. De fato, o casal foi fecundo e gerou nove filhos, quatro, porém, morreram ainda pequenos. Viveram cada morte como uma prova, e jamais perderam a confiança em Deus. Um dia quando Luis chegou em casa e viu sua filhinha, Helena, morta, chorou amargamente dizendo: “Minha pequena Helena, minha pequena Helena”. O casal orou junto e a ofereceu a Deus.

Nada abalava a fé desses gigantes. Em 1870, com a guerra franco-prussiana, hereges de corrente jansenista diziam que a França recebia um castigo divino. Zélia, porém, escreveu: “para eles, rigoristas, Deus é um deus que castiga. Triste doutrina que destrói os fundamentos da Esperança e faz de Deus um ser cruel”.

Luis “resume”, por assim dizer, em uma de suas cartas, sua vida cristã e seu amor pela Igreja: “Senhor meu Deus, nascido e crescido no seio de Sua Igreja, observei todos os seus mandamentos como vindos de Tua própria boca. Vi virem a mim homens cheios de novidades, com a Escritura na mão, tentando perturbar meu coração, ofendendo a minha Mãe, pregando a desobediência e a rebelião, mas eu permaneci fiel à Fé, ao que diziam nossos doutores, aos ensinamentos de nossos pastores. Apesar da exagerada beleza das vestes de alguns bispos e do escândalo da vida moral, eu os obedeci sem julgar”.

Podemos descrever aqui, também, a personalidade desse Santo Casal. Às vezes tem alguns que se parecem em tudo: temperamento, talentos, qualidades..., mas os dois são diferentes e se completam: Luis é um homem calmo, que cultiva o silêncio, discreto, ordenado, amoroso; Zélia é ativa, espontânea, viva, quase impulsiva.

Na beatificação do casal, o cardeal José Saraiva Martins afirmou que “é relevante ver como eles sempre se submeteram à Vontade Divina. Em sua casa Deus era sempre o primeiro a ser servido. Quando a provação atingia a família, a reação espontânea era sempre a aceitação da Vontade Divina. Serviram a Deus sobretudo no pobre e não por um impulso de generosidade nem por justiça social, mas simplesmente porque o pobre é Jesus”.

Zélia tem um tumor no seio direito que cresce escondido por dez anos, quando ela descobre resta-lhe pouco tempo de vida. Todos choram amargamente ao descobrir. Os papéis se invertem, ao invés de ela ser consolada, é ela quem consola a todos. “O Bom Deus me deu a graça de não ter medo. Estou tranquila e quase feliz”. Zélia falece no dia 28 de agosto de 1877, a partir daí Luis se refere a ela, para suas filhas, como “vossa santa mãe”.

Luis se torna um pai mais ativo, faz tudo por suas filhas e entrega a Deus Maria, Paulina, Celina e Santa Teresinha pelo Carmelo, e Leônia pelas visitandinas. Continua a ir à missa todos os dias e comunga frequentemente. Contudo, Luis Martin começa a manifestar problemas mentais, que evoluem e se manifestam fisicamente até a paralisia. Ele, porém, cresce no amor ao Bom Deus, e se oferece como vítima, em sacrifício.

Após anos de sofrimento, depois de ficar um bom tempo numa casa para doentes mentais, Luis é levado ao Carmelo de Lisieux para se despedir de suas filhas. Em um relato dessa despedida, foi dito que ele“[...] não conseguia falar, mas parecia entender todas as palavras das filhas. E quando elas lhe disseram ‘até logo’, ele ergueu o dedo indicador e, com dificuldade, disse: ‘Até o Céu!’”. Luis morre com 70 anos.

Assim termina a história dos santos que cuja devoção, creio eu, deve ser maximamente divulgada no meio católico, principalmente para casais de namorados, noivos e esposos. Com sua vida santificaram sua descendência e, nos tempos atuais, seu exemplo é mais que necessário. Que Luis e Zélia Martin intercedam por nossas famílias e, com seu exemplo, nos arrastem ao Céu.

Não me detive, a cima, a fazer os devidos louvores à família. Recomendo, porém, que o leitor busque o livro “Homem e mulher o criou – Catequeses sobre o amor humano”, onde São João Paulo II fala sobre a teologia do corpo.

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