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Brevíssima reflexão sobre a Lei Moral Universal



UMA PREMISSA básica da doutrina cristã é a que afirma que todo indivíduo humano naturalmente sabe o que é certo e o  que é errado, devido a uma lei moral presente no seu interior e que sempre existiu em todas as culturas.

Imaginemos um homem "A" que hipoteticamente achasse "certo" furtar um homem "B", – se esse homem "B" tivesse mais dinheiro do que precisasse, e se o homem "A" estivesse verdadeiramente precisando muito de dinheiro (digamos, para suprir suas necessidades mais básicas, como alimentação e vestuário). – O furto, num caso como este, poderia ser aceito como moralmente certo? Ou apossar-se de qualquer coisa que não lhe pertença, não importando as circunstâncias, é sempre moralmente errado? Independente da resposta, quem poderia julgar o homem "A" pelo seu ato?

Digamos que eu dissesse que a necessidade não justifica o crime, que continua sendo um crime de qualquer maneira, e que aquele homem "A" poderia e deveria procurar outros meios para resolver os seus problemas. Mas digamos que você, leitor, discordasse de mim, alegando que um fim bom (resolver os problemas reais e urgentes do homem 'A') poderia justificar um meio ruim (o furto). Quem estaria com a razão? E quem poderia definir quem tem razão?

Se não tivermos um ponto de referência moral, o que você pensa não será mais certo nem mais errado do que aquilo que eu penso. Caímos no relativismo absoluto. – Este relativismo moral, que parece prevalecer na mentalidade do mundo atual e que nos coloca uma questão fundamental, que já foi matéria de reflexão dos grandes pensadores da humanidade: haverá uma Lei Moral Universal?

Conduzimos nossas vidas de acordo com o nosso senso de certo e errado. De alguma maneira, possuímos a consciência do que devemos fazer. Quando falhamos em fazer o que entendemos que "deveríamos", uma parte bem específica de nossa mente, que chamamos de consciência, evoca um sentimento desagradável que chamamos de "culpa". Será que esse sentimento – presente em todos os indivíduos (a não ser, hipoteticamente, nos psicopatas), – é indicação para uma Lei Moral que nos foi dada pelo Criador Universal? Ou será que isso é reflexo, simplesmente, do que nos foi ensinado por nossos pais e educadores?

Nossa consciência influencia as decisões que tomamos ao longo de todo o dia. Se descobríssemos, numa estação rodoviária ou aeroporto, uma maleta cheia de dinheiro junto com endereço e telefone do dono, teríamos que decidir entre devolver a pasta ou guardá-la, e o faríamos conforme o nosso código moral. A maioria das religiões diriam que a atitude certa seria devolver a maleta, porém mesmo uma pessoa que não tem religião experimentaria um impulso para devolver o dinheiro. E mesmo aquele que resolvesse não devolver trataria de arranjar alguma desculpa para si mesmo, para poder ficar com o dinheiro. Essa pessoa poderia pensar: "quem perdeu isso tem mais do que eu", ou "estou precisando desse dinheiro", ou ainda "vou fazer bom uso dele"... E mesmo assim, certamente experimentaria algum "peso na consciência". Por quê? Por que é tão difícil simplesmente ficar com o dinheiro e aproveitá-lo sem pensar em mais nada, sem se importar com quem o perdeu ou com as consequências, imediatas e práticas ou transcendentais, do ato em si?

De onde vem esse código moral natural e universal? Ele não influencia apenas o nosso comportamento, mas influencia também a maneira como nos sentimos ao agirmos de determinada maneira. Os Dez Mandamentos do Antigo Testamento e os Dois grandes Mandamentos de Jesus Cristo (amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo) representam o ápice e o resumo perfeito de tudo aquilo que a humanidade já conseguiu desenvolver, até hoje, como regra de conduta social, mas o método científico simplesmente não pode responder à questão da Lei Moral Universal, assim como jamais poderia ser a fonte de todo o conhecimento do Universo.

A Lei Moral Universal encontra expressão não apenas nos textos sagrados, mas também no mais profundo de nossas consciências. Essa Lei, para muitos grandes pensadores, é um dos sinalizadores que apontam para a existência de um Criador, de uma Força Inteligente por trás do Universo físico. C. S. Lewis disse que temos duas sólidas fontes de evidências para a existência de um Deus Criador: "Uma é o universo que Ele criou... a outra é a Lei Moral que Ele pôs em nossas mentes".

Também o filósofo alemão Immanuel Kant apontou para a "Lei Moral dentro de nós" como um testemunho poderoso da grandeza de Deus. Ambos parecem corroborar o que disse Deus pela boca do Profeta: "Na mente lhes imprimirei as minhas Leis, assim como no coração lhas escreverei" (Jeremias 31,22).

«A lei moral é obra da Sabedoria divina. Podemos defini-la, em sentido bíblico, como uma instrução paterna, uma pedagogia de Deus. Ela prescreve ao homem os caminhos, as regras de procedimento que o levam à bem-aventurança prometida e lhe proíbe os caminhos do mal, que desviam de Deus e do seu amor. E, ao mesmo tempo, firme nos seus preceitos e amável nas suas promessas.

A lei é uma regra de procedimento emanada da autoridade competente em ordem ao bem comum. A lei moral pressupõe a ordem racional estabelecida entre as criaturas, para seu bem e em vista do seu fim, pelo poder, sabedoria e bondade do Criador. Toda a lei encontra na Lei eterna a sua verdade primeira e última. A lei é declarada e estabelecida pela razão como uma participação na providência do Deus vivo, Criador e Redentor de todos. 'Esta ordenação da razão, eis o que se chama a lei' 1.

'Entre todos os seres animados, o homem é o único que pode gloriar-se de ter recebido de Deus uma lei: animal dotado de razão, capaz de compreender e de discernir, ele regulará o seu procedimento dispondo da sua liberdade e da sua razão, na submissão Àquele que tudo lhe submeteu'»2.
(Catecismo da Igreja Católica, §1950-1951)


** Veja o que mais o Catecismo da Igreja Católica diz sobre a Lei Moral


__________

1. Leão XIII, Enc. Libertas praestantissimum: Leonis XIII Acta 8. 218: São Tomás de Aquino, Summa theologiae, 1-2, q. 90. a. 1: Ed. Leon. 7, 149-150.

2. Tertuliano, Adversos Marcionem, 2, 4, 5: CCL I. 479 (PL 2, 315).

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