Pular para o conteúdo principal

CRISTO E OS SACRAMENTOS



O Sacramento é um sinal sensível, instituído permanentemente por Cristo, para dar Graça. São como que sete artérias principais do Corpo Místico, pelas quais é transmitido às nossas almas, segundo as nossas necessidades, o poder da Paixão de Cristo que dá vida.
Cada Sacramento requer um ministro humano, mas a qualificação deste varia conforme o Sacramento. Só um Bispo pode ordenar e, salvo em casos especiais, só um padre pode consagrar o Santíssimo Sacramento do Altar, absolver os pecadores e ungir os moribundos; os ministros do Sacramento do Matrimônio são os nubentes; no entanto, atendendo à importância do Batismo, qualquer leigo o pode ministrar em caso de necessidade.
Em todos os Sacramentos, porém, o ministro principal é Cristo; o ministro secundário e humano atua em seu Nome. Cristo vive ainda na sua Igreja – Ele prometeu que estaria com ela todos os dias, até à consumação dos séculos. Em parte alguma se manifesta mais evidente o seu Poder vivo do que na administração dos Sacramentos; e em parte alguma Ele pode ser encontrado mais efetivamente do que aproximando-nos deles. Aí Ele fala conosco, perdoa-nos, fortalece-nos, santifica-nos, dá-nos o ósculo da reconciliação, concede-nos os seus próprios Méritos e o seu próprio Poder, aí dá-se todo a nós.
A respeito ao Sacramento do Batismo, que Sto. Tomás pôde escrever: “O Batismo incorpora-nos na Paixão e Morte de Cristo” – de onde se conclui que a Paixão de Cristo é administrada a cada pessoa batizada como remédio, como se fosse cada um de nós que tivesse sofrido e morrido... Porque a Paixão de Cristo é satisfação suficiente para todos os pecados de todos os homens. Mais adiante, volta a escrever Sto. Tomás: “Considerando que se torna membro de Cristo, a pessoa batizada participa do valor penal da Paixão de Cristo, como se ela própria tivesse sofrido essa penalidade”.
Visto que a Paixão de Cristo precedeu os nossos pecados como uma espécie de causa universal da remissão dos mesmos, necessita de ser aplicada a cada um de nós para nos purificar dos nossos pecados pessoais. Ora, isto se faz por meio do Batismo, da Penitência e dos outros Sacramentos que recebem o seu poder da Paixão de Cristo.
Todos os Sacramentos nos podem dar um aumento da vida da Graça, mas cada um deles dá, além disso, uma graça especial própria. Põem à nossa disposição a Força e os Merecimentos de Cristo para um fim especial. Pelo Batismo, somos purificados do pecado original e nascemos em Cristo. O Sacramento da Confirmação produz também em nós um aumento da graça habitual, nome pelo qual é conhecida essa participação na natureza divina, mas acrescenta-lhe ainda um auxílio especial. Este Sacramento corresponde ao que na vida civil se denomina “atingir a maioridade” e põe, à nossa disposição, uma fonte divina de força, para que vivamos a nossa fé nas nossas relações com os outros. Recebemos a força necessária para tomarmos o nosso lugar na sociedade, como católicos, como membros de Cristo, – pois isto é o que significa ser católico – e para professarmos a nossa fé abertamente, mesmo que tenhamos de sofrer e morrer por ela, se tanto for preciso.
A graça da Confirmação é, portanto, de grande alcance para todos nós, mesmo na sua forma extrema de nos infundir a fortaleza natural para sofrermos e morrermos pela fé. Esta graça é a origem daquela força extraordinária e coragem que admiramos nos mártires. Ai do católico que, na hora da provação, confiar na sua coragem natural e decisão. Mais vale que conte com a sua fraqueza e ponha a sua confiança na Força de Deus; que se glorie das suas fraquezas e invoque a Força de Cristo que lhe infunde o Sacramento da Confirmação.
Todos os leigos que vivem na sociedade moderna têm necessidade do auxílio divino para viverem com fé, e a dificuldade de assim procederem manifesta-se dia a dia, cada vez mais. O poder de professar a nossa fé, que recebemos com a Confirmação, é, em certo modo, semelhante ao poder do sacerdote de consagrar o Pão e o Vinho. Não nos apercebemos disso, mas devemos acreditar nele e usá-lo com fé e confiança.
Uma forma de manifestarmos essa crença e essa confiança reside na coragem com que devemos encarar todas as ocasiões em que há a necessidade de vivermos a nossa catolicidade, em atos e palavras, e de afrontarmos o ridículo, os sarcasmos, os prejuízos e até as injúrias que teremos de sofrer, procedendo assim. Uma vez que se manifeste a prudência ou a necessidade de ação, não deve haver mais hesitação, e não devemos perguntar a nós próprios de onde é que nos virá a força, porque esta já a recebemos com o Sacramento da Confirmação; e tudo o que Deus exige de nós é que admitamos a sua origem divina, apelando para Ele, mesmo que seja com um apelo mudo. Tais ocasiões verificam-se frequentemente hoje em dia.
Uma dessas ocasiões manifesta-se quando temos de defrontar os ares superiores que se dirigem às nossas noções “antiquadas” de moralidade católica; e o esforço tem de ser mais intenso, quando temos de assistir à corrente de condescendência que, devagar mas com firmeza, vai arrastando a maioria e afastando-a dos ensinamentos católicos. Em tais ocasiões sentir-nos-emos, por vezes, com falta de razão, provincianos e até pueris, e não faltarão mesmo ocasiões em que até passaremos por loucos, por amor de Deus.
Sentiremos também uma grande necessidade de auxílio especial que surge do fato de, por causa da nossa fé, termos de “morrer diariamente”; morrer para nós mesmos e para a nossa própria vida. Em tais ocasiões, devemos ter presente que somos membros vivos do Corpo Místico de Cristo e que, ao adquirirmos essa qualidade, renunciamos a nós próprios, “ao mundo, ao diabo e à carne”, e que fomos confirmados e fortificados com a promessa da Graça de Deus, para vencermos essas dificuldades; devemos lembrar-nos de que temos de viver a vida dos membros de Cristo – noblesse oblige – e, em vez de nos sentirmos cônscios de nós próprios pelo sentimento, devemos tornar-nos cônscios de Cristo, pela fé.
O Sacramento das Ordens Sacras diz respeito primariamente ao clero, mas como constitui certos homens mediadores entre Deus e a humanidade, tem também um efeito que diz respeito aos leigos, especialmente quando se trata de descobrir a e Vontade de Deus; e é sob esse aspecto que também nos pode interessar. O Sacramento da Extrema Unção tem ligação especial com o da Penitência, que vamos agora apreciar, como meio de nos aproximarmos de Cristo.
O Sacramento da Penitência foi instituído por Cristo para perdoar os pecados cometidos depois do Batismo. O Batismo elimina da alma todo o pecado e o castigo que lhe é devido; tudo o que estava em débito do nosso passado é cancelado. Não pode, porém, ser usado como remédio para os pecados cometidos posteriormente, porque não se pode repetir.
Esses pecados só podem ser remidos por um arrependimento sincero ou, normalmente, por meio do Sacramento da Penitência. Quando se trata de pecados mortais, só podem ser remidos pelo arrependimento que se chama contrição perfeita, que provém do amor de Deus e não do amor a nós próprios, e que deve incluir, pelo menos, um desejo implícito de nos confessarmos. Na Confissão, basta o arrependimento que se chama atrição e que provém do receio de ir para o inferno ou de perder o Céu.
A “penitência” que o sacerdote impõe depois da confissão tem uma eficácia especial em dar satisfação pelos nossos pecados, por causa da sua ligação com o Sacramento. Todas as nossas boas obras e tudo o que sofremos espontaneamente podem servir para dar tal satisfação, e podermos mesmo invocar os merecimentos de Cristo, de sua Mãe e dos Santos, em nosso favor. Os merecimentos de Cristo estarão sempre à nossa disposição, se soubermos fazer uso deles pela fé, esperança, caridade, humildade e submissão. É, porém, na Missa que devemos procurar a forma mais acessível da satisfação de Nosso Senhor pelos nossos pecados.
No Sacramento da Penitência, conseguimos uma graça que nos ajuda a restabelecer-nos dos efeitos do pecado, e uma nova força para combatermos as nossas fraquezas. Este aspecto da Confissão é muitas vezes esquecido, especialmente por aqueles que só têm pecados veniais para confessar. Porque são “só” veniais, há muitas vezes a tendência para não nos preocuparmos com eles. Cooperando com a graça do Sacramento, podemos adquirir um novo horror a estes pecados, uma nova delicadeza de consciência e uma noção mais clara e exata das nossas fraquezas. Ouçamos o que diz o Santo Padre, Papa Pio XII:
Para progredir mais rapidamente no caminho da virtude, recomendamos vivamente o pio uso da confissão frequente (...) que aumenta o conhecimento próprio, desenvolve a humidade cristã, desarraiga os maus costumes, combate a negligência e a tibieza espiritual, purifica a consciência, fortifica a vontade, presta-se à direção espiritual e, por virtude do mesmo Sacramento, aumenta a Graça.

A questão do arrependimento é uma das que nem sempre são devidamente compreendidas. O arrependimento necessário para a Confissão é um ato de vontade pelo qual, com o auxílio da Graça de Deus, aborrecemos os nossos pecados, resolvendo evitá-los no futuro, e nos voltamos para Deus.
É de importância capital que nunca consintamos que os nossos pecados passados – por mais imundos e aleivosos que nos pareçam – se interponham entre nós e Deus, façam-nos duvidar do seu amor, ou nos incutam o receio de nos aproximarmos dele com inteira confiança. Deus não faz nada pela metade. Quando perdoa os pecados, perdoa-os completamente. A culpa inerente a eles é completamente cancelada, e Ele não voltará a acusar-nos por isso. Mas a sua generosidade vai ainda mais longe. Quando uma alma cai em pecado mortal, perde todos os merecimentos da sua vida passada. Se, porém, se arrepende e consegue o perdão, esses merecimentos revivem outra vez, tal é a generosidade e o amor de Deus.
Obtido, porém, o perdão, não devemos consentir que o pensamento de novas dificuldades interfira com a nossa confiança. As próprias dificuldades, que são muitas vezes a consequência direta dos nossos pecados – os maus hábitos, por exemplo — são, na realidade, oportunidades providenciais que Deus nos dá para ganharmos novos merecimentos, os quais teríamos de procurar obter por outra forma, a fim de repararmos as nossas perdas. E se há dificuldades, também temos a Graça de Deus para as vencermos, a qual nos é dada de modo especial pelo Sacramento da Penitência e está sempre à nossa disposição no Santíssimo Sacramento.
Há um princípio que se deve ter sempre em mente, e é que não se devem ponderar nunca as dificuldades e os obstáculos, sem se ponderarem também os caminhos e os meios. Ora, no que diz respeito à Vontade de Deus, a sua Graça está sempre à nossa disposição e, se se pode sugerir uma máxima para a vida espiritual, e em especial para o pecador arrependido, essa máxima é: “Tudo posso naquele que me conforta” (Fl 4,13). E o que mais nos diz S. Paulo?
E disse-me: Basta-te a minha Graça, porque é na fraqueza que o meu Poder se manifesta por completo. Portanto, de boa vontade me gloriarei nas minhas fraquezas, para que habite em mim o Poder de Cristo (...) porque, quando estou fraco [quanto às forças da natureza] então sou forte [na Graça]. (2Cor 12,9-10)
Atrevemo-nos, mesmo, a dizer que há santos no Céu que nunca teriam atingido a glória presente, se não tivessem caído em pecado. O cardeal Billot diz o seguinte: “O pecador pode atingir maior perfeição, porque aquele que se entregou às obras heroicas depois do seu pecado é mais amado por Deus do que aquele que, embora não manchado pelo pecado mortal, é negligente no exercício da virtude”. As próprias palavras de Nosso Senhor são cheias de significado: “Digo-vos que, do mesmo modo, haverá maior júbilo no Céu por um pecador que fizer penitência, que por noventa e nove justos que não têm necessidade de penitência” (Lc 15,7).
Se há alguma coisa em que Nosso Senhor “se especializa” é em salvar os pecadores. “Não vim”, disse Ele, “chamar os justos, mas sim os pecadores” (Mt 9,13). Ele é “o Cordeiro de Deus, que tira os pecados do Mundo” ( Jo 1,29). S. João diz-nos: “Se caminhamos na Luz (...) O Sangue de Jesus Cristo purifica-nos de todo o pecado”; e “se confessamos os nossos pecados, Ele é fiel e justo para nos perdoar os nossos pecados e nos purificar de toda a iniquidade” ( Jo 7,10).
Para compreender o espírito com que Ele desempenha as suas funções, convém recordar as palavras que dirigiu a Santa Matilde, que lamentava os seus pecados e a falta de boas obras, e deplorava a negligência com que dissipava os dons de Deus. Ao confortá-la, Nosso Senhor disse-lhe: “Ainda que me fosses perfeitamente fiel, tu devias preferir infinitamente que fosse antes o meu amor a reparar a tua negligência do que tu própria, para que assim seja dada toda a honra e glória ao mesmo amor”
Foi Nosso Senhor em pessoa que nos disse que correria ao nosso encontro para nos reintegrar na herança perdida. A Maria Madalena foram-lhe perdoados muitos pecados, porque amou muito. Se o amarmos como ela, também os nossos pecados nos serão perdoados, e poderemos agradar mais a Deus com uma vida de amor fervoroso, depois de termos pecado, do que confiando tibiamente na nossa inocência passada. É com sinceridade que Deus nos diz: “Vai em paz”, porque depois de os nossos pecados serem perdoados, nós voltamos outra vez para Cristo, que é a Paz que ultrapassa toda a compreensão.

Fonte: livro:  Amor sublime (Eugene Boylan).

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Símbolos e Significados

A palavra "símbolo" é derivada do grego antigo  symballein , que significa agregar. Seu uso figurado originou-se no costume de quebrar um bloco de argila para marcar o término de um contrato ou acordo: cada parte do acordo ficaria com um dos pedaços e, assim, quando juntassem os pedaços novamente, eles poderiam se encaixar como um quebra-cabeça. Os pedaços, cada um identificando uma das pessoas envolvidas, eram conhecidos como  symbola.  Portanto, um símbolo não representa somente algo, mas também sugere "algo" que está faltando, uma parte invisível que é necessário para alcançar a conclusão ou a totalidade. Consciente ou inconscientemente, o símbolo carrega o sentido de unir as coisas para criar algo mair do que a soma das partes, como nuanças de significado que resultam em uma ideia complexa. Longe de objetivar ser apologética, a seguinte relação de símbolos tem por objetivo apenas demonstrar o significado de cada um para a cultura ou religião que os adotou.

Como se constrói uma farsa?

26 de maio de 2013, a França produziu um dos acontecimentos mais emblemáticos e históricos deste século. Pacificamente, milhares de franceses, mais de um milhão, segundo os organizadores, marcharam pelas ruas da capital em defesa da família e do casamento. Jovens, crianças, idosos, homens e mulheres, famílias inteiras, caminharam sob um clima amistoso, contrariando os "conselhos" do ministro do interior, Manuel Valls[1]. Voltando no tempo, lá no já longínquo agosto de 2012, e comparando a situação de então com o que se viu ontem, podemos afirmar, sem dúvida nenhuma, que a França despertou, acordou de sua letargia.  E o que provocou este despertar? Com a vitória do socialista François Hollande para a presidência, foi colocada em implementação por sua ministra da Justiça, Christiane Taubira,  a guardiã dos selos, como se diz na França, uma "mudança de civilização"[2], que tem como norte a destruição dos últimos resquícios das tradições qu

Pai Nosso explicado

Pai Nosso - Um dia, em certo lugar, Jesus rezava. Quando terminou, um de seus discípulos pediu-lhe: “Senhor, ensina-nos a orar como João ensinou a seus discípulos”. È em resposta a este pedido que o Senhor confia a seus discípulos e à sua Igreja a oração cristã fundamental, o  Pai-Nosso. Pai Nosso que estais no céu... - Se rezamos verdadeiramente ao  "Nosso Pai" , saímos do individualismo, pois o Amor que acolhemos nos liberta  (do individualismo).  O  "nosso"  do início da Oração do Senhor, como o "nós" dos quatro últimos pedidos, não exclui ninguém. Para que seja dito em verdade, nossas divisões e oposições devem ser superadas. É com razão que estas palavras "Pai Nosso que estais no céu" provêm do coração dos justos, onde Deus habita como que em seu templo. Por elas também o que reza desejará ver morar em si aquele que ele invoca. Os sete pedidos - Depois de nos ter posto na presença de Deus, nosso Pai, para adorá-lo